Projeto Cidadania nos Presídios conclui a primeira fase prática no Paraná


Projeto Cidadania nos Presídios conclui a primeira fase prática no Paraná

Seg, 17 out 2016 17:42:58 +0000

Na manhã desta segunda-feira (17/10), uma cerimônia realizada no Palácio da Justiça, sede do Tribunal de Justiça do Paraná, em Curitiba, marcou o encerramento simbólico da primeira fase prática do Projeto Cidadania nos Presídios no Paraná. Iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Paraná foi o segundo Estado brasileiro a implantar o Projeto, após o Espírito Santo. O Projeto Cidadania nos Presídios aponta uma nova sistemática de execução penal no País

Na solenidade, foi assinada uma parceria entre o Poder Judiciário paranaense e a Rede de Proteção à Gestante do Governo do Paraná. A parceria, que será coordenada pelo Hospital Victor Ferreira do Amaral, terá como meta o parto humanizado e gestação assistida às mulheres presas no Sistema Penal do Estado.

Há um protocolo de intenções, já assinado entre o TJPR e a Universidade de Chicago, que permitirá intercâmbio de ideias e experiências ao Projeto Cidadania nos Presídios.

O Presidente do Tribunal de Justiça do Paraná, Desembargador Paulo Roberto Vasconcelos, comentou que tem participado do Conselho, em Brasília, com a Ministra Carmen Lúcia. “Lá, cada Presidente teve a oportunidade de falar sobre seu Estado e o Paraná é referência. “Principalmente nos projetos que envolvem os Direitos Humanos”, comentou Vasconcelos.

O Chefe da Divisão Médica do Complexo HC-UFPR – Maternidade Victor Ferreira do Amaral, Marcos Takimura, afirmou que o trabalho não deverá se restringir apenas as gestantes. “Ao longo do tempo, queremos oferecer outros serviços que estão disponíveis e são especialidades em nosso hospital”, disse.

Para o Diretor Geral do Departamento Penitenciário (Depen), Luiz Alberto Cartaxo Moura, esse convênio irá mudar o tratamento com as mulheres. “O projeto vem uma boa hora, é algo humano que damos à essas mulheres”.

Primeira fase prática –

Um mutirão concluído na sexta-feira (14/10) atendeu cerca de 300 mulheres presas na Penitenciária Central do Estado (PCE) de Piraquara. A ação, realizada pelo Patronato Penitenciário do Paraná e pelo Conselho da Comunidade, aconteceu em duas etapas (de 26 a 30/9 e de 10 a 14/10).

O objetivo principal era rever individualmente cada processo. “A detenção não se justifica para um percentual expressivo destas mulheres, pois elas não representam perigo à sociedade”, disse o Supervisor do Grupo de Monitoramento e Fiscalização (GMF) do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas do Paraná, Desembargador Ruy Muggiati.

“Nunca se prendeu tanto e nunca houve tanta violência”, comentou. Muggiati lembrou ainda o alto custo mensal de cada preso ao Estado, além do baixo índice de ressocialização.

Na prática, o Desembargador informou que, numa primeira etapa, foi feito um levantamento das presas gestantes, idosas, doentes ou mães de filhos pequenos. O trabalho de mapeamento e avaliação psicossocial das internas teve início há um ano, numa parceria com a Pontifícia Universidade Católica (PUCPR), através de estágio supervisionado de alunos do último ano do curso de Psicologia.

“O Projeto Cidadania nos Presídios significa um avanço, ajudando a preparar os presos para o seu retorno à sociedade”, elogiou a Professora Janice Strivieri Souza Moreira. “Esta parceria entre a academia e o Judiciário tem imensa importância para nós, pois permite que os alunos enxerguem as necessidades reais”, comentou.

Entre as presas que foram ouvidas no mutirão estava, por exemplo, uma dona de casa de 46 anos, moradora de Almirante Tamandaré, sem antecedentes criminais que foi detida ao furtar comida. Também na PCE de Piraquara, uma adolescente de 19 anos, detida em Curitiba com 30 gramas de crack, aguardava ansiosa pelo atendimento ao seu processo.

Liberdade para os filhos de presas –

A Procuradora de Justiça Maria Tereza Uille Gomes, do Conselho Nacional de Política Criminal Penitenciária, presente à solenidade de segunda-feira, destacou que o desencarceramento privilegia a Lei do Estatuto da Primeira Infância.

“Muitas vezes a mulher não representa perigo a sociedade e a sua prisão leva ao cerceamento do direito de liberdade também de seus filhos”, comentou a Procuradora. Ela informou que o Paraná é o primeiro Estado brasileiro a inverter esta cultura jurídica e priorizar o direito destes menores.

Penitenciária Modelo -

Após a revisão dos processos, as mulheres presas na unidade prisional de Piraquara pelo Poder Judiciário do Paraná poderão migrar para o sistema aberto ou semiaberto, terem sua saída autorizada ou serem transferidas para outra unidade.

Desta forma, a atual PCE feminina de Piraquara será esvaziada e, no local, será instalada uma Penitenciária masculina modelo. A previsão é de o processo tenha início ainda neste ano. “Será uma penitenciária pioneira no Brasil”, informou o Desembargador Muggiati.

O Juiz Eduardo Lino Bueno Fagundes Júnior, Coordenador do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e de Medidas Socioeducativas (GMF/PR), explicou que a Penitenciária Modelo irá abrigar presos que estejam a um ano de progredir de pena ou do livramento condicional.

Eles também estarão condicionados a um regime de 100% de estudo e trabalho e serão submetidos à entrevista e monitoramento feitos pela equipe da PUCPR. “Estes presos também terão atendimento social, que irá reforçar vínculos familiares e pré-preparo ao mercado de trabalho, e de saúde, tudo visando prepara-lo para a sua saída do sistema penal”, informou. Além disso, haverá trabalhos de justiça restaurativa, inclusive para os servidores do Sistema Penitenciário.

Entre outras autoridades, participaram da visita à PCE de Piraquara, onde aconteceu o mutirão: a Diretora da Penitenciária Central Feminina do Paraná, Cinthia Mattar Bernardelli Dias; o Presidente do Conselho Penitenciário, Dálio Zippin; e o Diretor Adjunto do departamento Penitenciário (Depen), Cezinando Vieira Paredes.

Na solenidade desta segunda-feira, também estavam presentes as autoridades: Corregedor de Justiça, Desembargador Robson Marques Cury; Juiz Auxiliar da Presidência do TJPR Rodrigo Dalledone; Presidente do Conselho Penitenciário, Dalio Zipin, e Presidente do Conselho da Comunidade na Execução Penal, Isabel Kugler Mendes.

Cidadania nos Presídios -

O Projeto Cidadania nos Presídios foi lançado oficialmente no TJPR no último mês de agosto. Iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), aponta uma nova sistemática de execução penal no País.

“O Projeto Cidadania nos Presídios representa um importante marco para a urgente reforma do sistema carcerário. Hoje, os presídios funcionam como depósitos de seres humanos, universidades do crime. Esse é um momento de assumir responsabilidades”, disse o Desembargador Ruy Muggiati

Segundo o CNJ –

O Projeto Cidadania nos Presídios é muito mais que uma proposta de atualização de processos. É uma iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pelo reconhecimento e pela valorização de direitos, em sentido amplo. Discutir-se nova dinâmica e metodologia para o sistema de execução e fiscalização das penas, revendo o funcionamento das varas de execução penal e a superocupação dos presídios, com o reforço da interlocução e interação de todos aqueles que intervêm no processo e nas rotinas da execução penal, têm aptidão para tornar o sistema de justiça mais humano, aproximando o juiz e a sociedade do jurisdicionado.

Atualmente, os mais de 700 mil presos que se encontram cumprindo penas em território nacional em regime de encarceramento fazem do Brasil o país com a terceira maior população prisional, em termos absolutos.

O modelo de encarceramento que praticamos, infelizmente, alimenta um ciclo de violências que se projeta para toda a sociedade, reforçado por uma ambiência degradante em estabelecimentos que pouco ou minimamente estimulam qualquer proposta de transformação daqueles que ali estão. O tratamento digno e com respeito de presos é indício da civilização de uma sociedade e o primeiro passo que se dá na tentativa de regenerar aquelas vidas.

Dados de 2014 do Ministério da Justiça mostram que o número de pessoas presas no Brasil aumentou mais de 400% em 20 anos. De acordo com o Centro Internacional de Estudos Penitenciários, ligado à Universidade de Essex, no Reino Unido, a média mundial de encarceramento é 144 presos para cada 100 mil habitantes. No Brasil, o número de presos sobe para 300.

Em junho de 2014, o Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF), do CNJ, fez um levantamento inédito ao incluir nesta estatística as pessoas em prisão domiciliar. Os dados apresentados revelam que a população carcerária brasileira é de 711.463 presos, o que coloca o Brasil na terceira posição mundial de maior população de presos.

Ao mesmo tempo há um déficit de 354 mil vagas no sistema carcerário. Se se considerarem os mandados de prisão em aberto – 373.991 – a população carcerária saltaria para mais 1 milhão de pessoas.