Magistrado Josué Corrêa Fernandes
MAGISTRADO JOSUÉ CORRÊA FERNANDES
Por Desembargador Robson Marques Cury
Josué Corrêa Fernandes nasceu em 30 de janeiro de 1947, em Prudentópolis, Paraná, filho de José Rodrigues Fernandes e Virgínia Corrêa Fernandes. Casado com Lílian Helena Gomes Fernandes, tem os filhos Fabíola, Paulo de Tarso e Felipe Cesar.
Fez seus primeiros estudos em escolas públicas de Prudentópolis. Em 1965, ingressou na Faculdade de Direito da UEPG. Foi professor de primeiro e segundo graus em Prudentópolis e, depois de fazer cursos de especialização, lecionou Direito, na antiga Faculdade de Ciências e Humanidades da cidade de Pato Branco, onde, por quatro anos, chefiou o Departamento de Ciências Jurídicas. Ainda no magistério, foi o primeiro Coordenador Geral do Curso de Preparação para Ingresso na Magistratura, em Ponta Grossa, onde ainda lecionou Direito Administrativo e Direito Processual Penal – Instituição do Tribunal do Júri.
Advogou em Prudentópolis por anos e, em 1980, Josué Fernandes ingressou na Magistratura do Estado do Paraná, vindo a exercer a judicatura em Castro, Piraí do Sul, Curiúva, Faxinal, Chopinzinho, Pato Branco, Maringá e Ponta Grossa, onde se aposentou como juiz diretor do Fórum.
Em sua cidade natal, foi vereador (1969 a 1972) e prefeito (1973 a 1976), além de presidir a Associação dos Municípios do Centro-Oeste do Paraná.
Após aposentado, retornou à advocacia e foi secretário de Administração e Assuntos Jurídicos de Ponta Grossa nas gestões dos prefeitos Paulo Cunha Nascimento (durante quatro anos), Pedro Wosgrau Filho (um ano) e Marcelo Rangel Cruz de Oliveira (oito meses).
Josué Fernandes publicou diversos artigos em jornais locais, nas revistas Toga e Literatura, Helena e Advocatus, além de proferir inúmeras palestras versando temas da história regional e do Paraná. Publicou as seguintes obras: Saga da Esperança – Trajetória do Dr. Jean-Maurice Faivre; Pequena biografia de Manoel Ribas; Das Colinas do Pitangui... – histórias dos Campos Gerais; Corina Portugal – história de sangue & luz (1ª e 2ª edições); O alfanje e o centeio – crônicas da imigração eslava no Paraná; Saga da esperança – Socialismo utópico à beira do Ivaí (2ª edição atualizada e aumentada de Saga da esperança – trajetória do Dr. Jean-Maurice Faivre); Ponta Grossa – história mínima contada dia a dia.
Tomou posse na Academia de Letras dos Campos Gerais em 2 de junho de 1999 como fundador da cadeira nº 10, em cerimônia realizada no Clube Pontagrossense, sendo recepcionado por Túlio Vargas, presidente da Academia Paranaense de Letras.
Foi o primeiro vice-presidente da Academia de Letras dos Campos Gerais e, em seguida, presidente no biênio 2001/2002; é acadêmico da Academia de Letras Maçônicas do Paraná; membro do Instituto Histórico e Geográfico do Estado do Paraná; cidadão honorário de Ponta Grossa, Faxinal, Chopinzinho e cidadão benemérito de Prudentópolis. Recebeu o prêmio de Destaque Literário na Semana Cultural Bruno e Maria Enei, além de outras honrarias de entidades como o Rotary Clube e o Lions Clube, UNIGUAÇU, Centro de Letras do Paraná e Academia Nacional de Medicina.
Jurista, professor e literato consagrado, Josué Corrêa Fernandes edificou, ao longo da sua profícua carreira, uma sólida reputação.
Como relator e vogal de julgamentos de inúmeros recursos no Tribunal de Alçada e no Tribunal de Justiça, em face de sentenças proferidas pelo juiz de Direito Josué Corrêa Fernandes, corroborei a qualidade de suas decisões, eivadas de fundamentação de excelente qualidade jurídica, demonstrando imparcialidade e bom senso na análise das teses defendidas pelas partes.
Deveras singular é a faceta de escritor do Josué Corrêa Fernandes, como demonstra seu artigo intitulado “Em defesa das pombinhas”, eivado de cunho histórico e ecológico, publicado em 30/12/2018 no portal D’Ponta News (Internet).
“Sisudos historiadores, mormente aqueles que possuem formação acadêmica, não admitem que a história seja contada com base em fatos não assentados em fontes concretas, repugnando-lhes a tal tradição oral, ou, ainda, a mistura de lendas a eventos de realidade indiscutível. Exigentes, pretendem que a história retrate uma situação determinada e palpável, sem os complementos ditados pela imaginação popular ou pela quimera dos poetas.
Por isso, já tivemos oportunidade de ler opiniões e de ouvir vozes técnicas fazendo blague com o capítulo das pombinhas que ilustra a história princesina (o brasão e a própria bandeira do município) e que vem narrado, ao longo dos anos, por diversos polígrafos. Alguns desses críticos, com refinada ironia, declaram que, na década de 1820, nem pombas domésticas existiam na região onde está hoje plantada a cidade de Ponta Grossa, esquecendo-se, todavia, que o pombo selvagem (Columba livia) é o antepassado de praticamente todas as variedades dessa espécie e que ornitólogos de nomeada registram a presença de aves de estimação nos lares desde a Idade do Bronze.
Antes, porém, de outras considerações, é preciso que se fixe o episódio no tempo e no espaço. Sebastião Paraná, na “Chorographia do Paraná”, editada em 1899, após dizer que Miguel da Rocha Ferreira Carvalhaes foi quem doou as terras para a instalação do povoado, afirma que, no início, houve uma certa dúvida sobre o local onde deveria ser construída a capela dedicada a Santa Ana e onde, por consequência, surgiriam as primeiras edificações do aglomerado urbano: uns eram de parecer que o melhor lugar se situava na chapada da Cascavel; outros entendiam que o sítio ideal era a elevação onde, ao lado de centenária figueira, já fora levantada uma cruz. Para pôr fim à disputa, acordou-se, naquela segunda década do século XIX, que se soltassem pombos, sendo definitivamente escolhido o lugar onde as referidas aves pousassem. “Estas, depois de adejarem por um tempo, como que escolhendo o ponto onde deveriam assentar, enveredaram em direção ao arvoredo plantado junto à cruz, erguida na colina”, escreve Paraná.
O dr. Brazílio Ferreira da Luz, jornalista, político e médico, que residiu e clinicou em Ponta Grossa no ano de 1886, em data bem anterior àquela em que foi editada a obra de Sebastião Paraná, conta também, no livro “Páginas Antigas”, a mesma história: “A pomba, mensageira, subiu, volteou no espaço por largo tempo, acalentando esperanças de um e de outro [dos dois proprietários de terras que disputavam a primazia da localização da vila], e, orientada, rumou para os braços de um cruzeiro, onde pousou, afinal. Ao lado desse cruzeiro, dominando a planície, construiu-se a capella [SIC] e, ao redor, agruparam-se as primeiras casas da povoação. Assim nasceu a Princeza [SIC] dos Campos, tendo por throno [SIC] o alto do morro.”
Depois, Ermelino de Leão, no “Dicionário Histórico e Geográfico do Paraná”, e o “Álbum do Paraná” (1921) repetem idêntica narrativa, que, em 1935, Manoel Cyrillo Ferreira (“Miscelânea da História de Ponta Grossa”), descendente dos fundadores da cidade, confirma com mais detalhes, asseverando que a arbitragem dos pombos na localização da capela e da sede da futura vila foi resolvida em reunião da qual participaram, além do sargento-mor Miguel Carvalhaes, ainda o seu cunhado Domingos Ferreira Pinto (pai do Barão de Guaraúna), Benedicto Mariano Ribas, Domingos Ferreira Lobo, Atanagildo Pinto Martins e outros.
Em palavras inspiradas e poéticas, o evento ainda é confirmado pelo provecto senador Flávio Carvalho Guimarães, que, em 1921, no “Guia de Ponta Grossa”, acentua que tudo provém do eco de testemunhas oculares, que foram transmitindo aos filhos e aos netos toda essa história tecida de magníficos ensinamentos: “Sobre uma cruz esquecida e velha, abandonada, solitária, sem lágrimas e sem prece, com os braços cansados de silêncio e abertos às mágoas das almas que por ali transitavam, o carinhoso pássaro pousou… Nesse dia, aqueles homens começaram o trabalho de união mais íntima em prol de seus ideais de coesão e harmonia, e, com fé, lançaram a semente de uma grande cidade, nascida e formada aos beijos da paz e aos raios do mais fraternal litígio que hei conhecido em minha vida.” Não se há de olvidar que o ilustre parlamentar, filólogo e jurista promana de famílias que há três séculos marcam presença nos Campos Gerais.
Em 1943, Pedro Novaes, do Círculo de Estudos Bandeirantes, escreveu a “Fundação de Ponta Grossa”, no qual lembra que Miguel Carvalhaes, desde 1805, era proprietário, dentre outros imóveis, da fazenda Rincão das Pombas (lugar onde atualmente está plantada uma parte do centro da cidade), repisando, em seguida, a história das duas avezinhas. Na mesma linha é o posicionamento de Reynaldo Ribas Silveira, um dos mais fecundos pesquisadores princesinos.
Em tempos mais recentes, Valfrido Piloto (“Tinguianas”) e Eno Theodoro Wanke (“O Vôo da Pombinha”) também se reportam ao assunto, escrevendo o primeiro que “bem conhecido, por lhe ouvirmos reiteradas referências, é aquele tatalar de asas nevíneas, esvoaçantes na luz, quase hipnotizadas pela imensidade verde e azul do céu e dos campos”, sendo certo que o segundo, ponta-grossense nato, além do belo poema traduzido para vários idiomas, elaborou ainda matéria específica a respeito, para concluir que o episódio das pombinhas é efetivamente um fato de compleição histórica. Não se pode esquecer também que, na aquarela chamada “La Ponta Grossa”, pintada por Debret em 1827, percebe-se claramente a existência do tão falado cruzeiro em que as aves teriam pousado.
Ao lado, pois, do colorido que os cronistas, inspirados e de boa-fé, emprestaram ao assunto, existem fundadas razões para que o tema não seja olhado com os olhos da desconfiança e da mofa.
Para nós, trata-se da mais pura tradição oral que, se falsa ou fantasiosa, teve muito tempo para ser desmentida pelos pósteros dos primeiros povoadores. Lembremo-nos, por exemplo, que o Barão de Guaraúna, filho de “Mingote”, viveu em Ponta Grossa até o ano de 1891, e que o brigadeiro Manoel Ferreira Ribas, mais o filho comendador Augusto Ribas e o neto governador Manoel Ribas (três gerações de Benedicto, testemunha do episódio à semelhança de Domingos), também por aqui estiveram ao longo de muitas décadas, participando ativamente da vida pública princesina, sem nunca apresentarem qualquer contestação a essa história.
Se, porém, algum dia restar evidenciado que tudo não passa de mera lenda, ainda assim não se há de apagar o caso das pombinhas da história que narra as origens da Terra Pitangui, afinal, Roma ergueu monumentos em homenagem à loba do Palatino que amamentou Rômulo e Remo, atribuindo-lhes convictamente a sua fundação. Toda a história da capital da Itália, aliás, tem na lenda o seu início: recorde-se do rapto das Sabinas, da Ninfa Egéria de Numa, de Camilo, de Coriolano. Lembre-se também de crônicas religiosas e de cavalaria, dos tempos mais modernos, em que há muito mais de lenda do que de história real: El Cid Campeador, os Pares de França, a Távola Redonda, Rolando etc.
Como arremate, é de se evocar as palavras de Antero Figueiredo, para quem “de toda a deformação que da história se faz, a única desculpável, por ser a única aproveitável ao sonho (alimento da vida), é a que se exerce no sentido da beleza – convergência luminosa em que os espíritos se encontram extasiados, acordes e amigos.”
A Toga e Literatura, revista cultural da Amapar, número 05, edição de junho de 2010, reproduz seu histórico texto intitulado “O Julgamento”, sobre a primeira sessão no interior do Paraná do tribunal do júri, em 27 de novembro de 1834, na Freguesia de Ponta Grossa, presidida pelo juiz de Direito da 5ª comarca, dr. Agostinho Ermelino de Leão, envolvendo delito de homicídio acontecido em Castro, com a participação de diversas autoridades.
Com farta produção intelectual, consubstanciada precipuamente em diversos livros, o doutor Josué Corrêa Fernandes, sob a minha ótica, escreveu erudita peça literária, ao prefaciar o livro intitulado “Lagariço – Frutos de uma mente inquieta”, escrito pelo ponta-grossense Wilson J. Comel, genitor da magistrada Denise Damo Comel.
Transcrevo trechos iniciais:
“Passaram mais de cinquenta anos daqueles momentos únicos que, absorto, assistia às aulas de Direito Civil no primitivo prédio da UEPG, ministradas com clareza e erudição pelo professor Wilson Jeronymo Comel. Foram lições que me acompanharam pela vida profissional afora, seja como advogado militante ou como juiz de Direito, e que ficaram indelevelmente registradas e para sempre lembradas a cada passo da longa jornada que até aqui encetei.
Décadas depois, quando exerci a magistratura em Ponta Grossa, reencontrei o excelente mestre e denodado civilista, que mantinha a mesma performance de outros tempos.
Mais um pouco à frente e juntos, éramos confrades na Academia de Letras dos Campos Gerais (cujas cadeiras ainda teimamos em ocupar!).”
A sua paixão pelos fatos históricos está traduzida em recente obra, após cerca de duas décadas de pesquisa e de cinco anos de escrita, o livro “Maragatos – A Guerra Civil no Paraná”. Essa obra foi lançada em 17/05/2024 na sede da ACIPG – Associação Comercial, Industrial e Empresarial de Ponta Grossa, contribuindo com mais informações e reflexões (algumas até então inéditas) sobre a Revolução Federalista, que completa 130 anos de seu término.
O livro “Maragatos – A Guerra Civil no Paraná” traça um amplo retrato do período em que a Revolução Federalista estourou no Sul do Brasil, entre 1893 e 1895, inicialmente no Rio Grande do Sul, espalhando-se depois para os estados de Santa Catarina e Paraná.
A obra aborda, sobretudo, os impactos deste acontecimento histórico no território paranaense, incluindo estratégias políticas, o movimento das tropas dos federalistas “maragatos” e dos republicanos “pica-paus”, a violência e as injustiças do conflito armado.
Além do enfoque paranaense, traz como diferencial informações inéditas acerca do conflito (extraída de diversos documentos e publicações pesquisados pelo autor) e dá voz para personagens que, até então, foram pouco favorecidos em boa parte dos relatos históricos já lançados.
“Juntei muita bibliografia e documentos relacionados e cheguei à conclusão de que a história a respeito da intervenção dos federalistas, especialmente no Paraná, não fazia justiça a esses revolucionários. Tanto na época que antecedeu a revolução, como depois”, afirma o autor Josué Corrêa Fernandes.
Desembargador Robson Marques Cury