Desembargador Gamaliel recebe prêmio do CNJ e da Secretaria Especial de Direitos Humanos

Desembargador Gamaliel ao lado da Ministra Carmen Lúcia. Foto Divulgação CNJ.

DESEMBARGADOR GAMALIEL RECEBE PRÊMIO DO CNJ E DA SECRETARIA ESPECIAL DE DIREITOS HUMANOS

Na última terça-feira (14/2), no CNJ em Brasília, o Desembargador Gamaliel Seme Scaff recebeu prêmio do CNJ no I Concurso Nacional de Decisões Judiciais e Acórdãos em Direitos Humanos, na categoria de Promoção e respeito à diversidade religiosa. Foram 13 categorias ao todo.

A decisão premiada

O Acórdão da relatoria do Desembargador Gamaliel Seme Scaff, inscrito no concurso, foi o da EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO nº 866.219-7 dentre outras 33, manejadas contra a mesma Juíza, Dra Gabriela Milazzo, por razões de fundo religioso na supervisão de abrigos de crianças em situação de abandono. Foi julgado no TJPR pela 11ª Câmara Cível, em composição integral cuja proposta de voto foi acolhida à unanimidade por todos os seus integrantes de então (Des. Augusto Lopes Cortes in memoriam, Des. Fernando Wolff Bodziak, Des. Ruy Muggiati e Desª Vilma Régia Ramos de Rezende).

Entendendo o caso

As EXCEÇÕES DE SUSPEIÇÃO promovidas contra a doutora Juíza da Vara da Infância e Juventude de Paranaguá, todas propostas pelo Promotor de Justiça que atuava nessa vara, tiveram por embasamento o artigo 135, V do CPC/73 (“Art. 135. Reputa-se fundada a suspeição de parcialidade do juiz, quando: [...] V - interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes”).

Para embasar a suspeição, o representante do Ministério Público passou a elencar fatos que teriam chegado ao seu conhecimento por “denúncia anônima” e que supostamente sugeririam favorecimento da juíza a instituições de acolhimento cristãs, de linha evangélica. Na referida comarca existem instituições de acolhimento também cristãs de fé católica e espírita, além daquela.

A suposta transgressão residiria no fato de que “crianças acolhidas institucionalmente estariam frequentando aos domingos, cultos evangélicos no ‘Ministério Castelo Forte’”, além do fato de que os pastores cuidadores (casal) estariam “realizando atividades nos abrigos durante a semana”, o que, segundo aquele representante do MP, seria irregular porque esses serviços religiosos estariam ocorrendo “sem aprovação de projeto pedagógico pelo Conselho Municipal da Criança e do Adolescente”, com a concordância não só da juíza como também do responsável pela Secretaria Municipal de Assistência Social de Paranaguá.

Fundamentalmente, afirmou o representante do MP que “a promoção de cultos para crianças seria irregular/ilegal e as estaria prejudicando, porquanto sujeitas a doutrinação e manipulação” e que, sendo laico o Estado, tal não poderia ocorrer.

O parecer da Procuradoria de Justiça (MP no TJPR) foi no sentido de não identificar favorecimento algum, opinando pelo desprovimento da suspeição da juíza.

A decisão trabalhou aspectos históricos do assistencialismo praticado desde sempre pela Igreja (fé cristã de todas as linhas) às crianças abandonadas, contribuindo com o Estado com base em trabalho de pesquisa de cerca de 10 anos realizado pelo Centro de Demografia Histórica da América Latina da Universidade de São Paulo, coordenada pela historiadora Doutora Maria Luiza Marcilio, bem como, a liberdade de culto e de crença religiosa consagradas em nossa Constituição Federal (1988), a lattere da laicidade do Estado, culminando com a Convenção da ONU de 1989 sobre os Direitos da Criança, em cujo artigo 14 consigna que “Os Estados Partes respeitam o direito da criança à liberdade de pensamento, de consciência e de religião”. O Brasil é signatário dessa convenção.

A César o que é de César...

Por fim, o voto procura discernir o fato de o Estado brasileiro ser laico a significar apenas que o governo não se sujeita à interferência da religião em suas decisões e diretrizes. Por outro lado, por haver liberdade de crença e de culto igualmente consagradas na mesma Carta Constitucional que diz ser laico o Estado, o reverso da moeda é verdadeiro: o Estado não deve interferir na religião. Assim, concluiu-se “Nada razoável também, a pretensão do órgão do Ministério Público em Paranaguá de exigir que uma instituição religiosa de caridade ensine às crianças que retira do abandono, valores inversos aos que prega: ateísmo ao invés de crença”.

Esse posicionamento do representante do MP não representou o posicionamento da instituição, tanto que o parecer da Procuradoria na instância superior foi em sentido contrário àquela pretensão.

Os 34 incidentes opostos, um para cada criança, foram indeferidos com determinação de arquivamento, como afirmação de contrariedade a qualquer manifestação de preconceito ou intolerância religiosa, porquanto “O interesse de uma criança a respeito de certa linha religiosa se traduz em direito e não em abuso de direito ou ilegalidade”.

Outros juízes paranaenses também premiados

Outros dois magistrados paranaenses também receberem prêmios no concurso: Juiz Bráulio Gabriel Gusmão, titular da 4ª Vara do Trabalho de Curitiba; e a Juíza Angélica Cândido Nogara Slomp, titular da 2ª Vara do Trabalho de Francisco Beltrão, ambos do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 9ª Região.

A palavra da Ministra Carmen Lúcia no evento da premiação

A Ministra Carmen Lúcia, Presidente do CNJ, reforçou que “o princípio mais importante do constitucionalismo contemporâneo, do direito contemporâneo, do direito brasileiro em vigor é o princípio da dignidade humana, e ele só se cumpre com respeito integral aos direitos fundamentais”. Ressaltou ainda que as decisões premiadas teriam por objetivo “sinalizar uma direção para a Justiça” e o apoio do Conselho Nacional de Justiça a esse norte.

Dedicação do prêmio

O Desembargador Gamaliel Scaff dedicou a premiação a todos os seus colegas da 11ª Câmara Cível (órgão em que foi proferida a decisão unânime), mas igualmente a todo o Judiciário Paranaense “porquanto tal conquista não é de um só, mas de todos os juízes paranaenses que trabalham duro como instrumentos da paz para a sociedade e preservação de direitos fundamentais da população”.

Confira a íntegra da decisão. TJPR/ES 866.219-7