
PROJETO GARANTE TRABALHO E INCLUSÃO DE DEFICIENTES AUDITIVOS
Pioneiro dentro do Tribunal de Justiça, o projeto Abraçar para Incluir é realizado no Centro de Digitalização em Curitiba
Desde 2014 o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) conta com a colaboração de portadores de necessidades especiais no trabalho de digitalização de processos judiciais. A iniciativa faz parte do Projeto Abraçar para Incluir, criado pela servidora Daniela Ribas Rocha, que supervisiona o Centro de Digitalização, em Curitiba. No local trabalham atualmente 44 colaboradores, seis deles com deficiência auditiva.
Para garantir a efetividade e a continuidade do projeto, o Tribunal firmou uma parceria com a Universidade Livre para a Eficiência Humana (Unilehu), associação civil sem fins lucrativos que atua no desenvolvimento profissional de pessoas com deficiência. Uma característica importante desse trabalho é a oportunidade que os colaboradores têm de estarem em um ambiente que promove a integração e a realização de uma atividade intelectiva. A cada duas semanas uma psicóloga da Unilehu realiza uma visita à unidade para garantir a efetividade do desenvolvimento profissional deles.
A iniciativa inspirou um trabalho semelhante na Comarca de Foz do Iguaçu, onde há uma parceria com a Fundação Parque Tecnológico Itaipu e com a Associação de Pais e Amigos dos Surdos de Foz do Iguaçu (APASF). A Fundação forneceu os equipamentos necessários e também um intérprete. Lá o trabalho é realizado por seis estagiários do TJ-PR com deficiência auditiva e supervisionado pelo Centro de Digitalização com a participação dos servidores locais.
Trabalho
O Centro de Digitalização realiza a virtualização dos recursos aos Tribunais Superiores. Eles são inseridos nos sistemas Projudi, e-STJ e PJe. Em média cada colaborador consegue digitalizar em torno de três mil páginas por dia. A produção dos funcionários com deficiência costuma ser superior à dos outros. Daniela explica que a rapidez e a eficiência no desenvolvimento das atividades se deve ao alto grau de concentração desses colaboradores.
Início
As atividades no Centro de Digitalização tiveram início em 2012, a partir de uma determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para criação do processo eletrônico. No início Daniela contava com apenas um estagiário e uma digitalizadora. Quando o Superior Tribunal de Justiça (STJ) deixou de receber processos físicos, houve a necessidade de aumentar a estrutura do Centro, com mais funcionários e equipamentos de digitalização.
A supervisora do Centro conta que foi a Brasília conhecer o trabalho de digitalização realizado no STJ. “Lá já havia uma atividade desse tipo, mas eles ficam separados dos demais funcionários. Aqui a minha ideia era integrá-los, por isso o nome do projeto Abraçar para Incluir.”
A intenção da criadora do projeto é expandi-lo para outros setores do Tribunal de Justiça. Ela espera também que possa atender os portadores de outras necessidades especiais e que práticas semelhantes possam ser adotadas pelos demais órgãos públicos. “Às vezes os instrumentos estão à nossa mão para ajudá-los, e não percebemos isso. A ideia é ampliar cada vez mais o projeto, para colocar a sociedade mais próxima dos deficientes e realmente esquecer que existe a deficiência”, afirma.
Integração
A colaboradora Karolina de Carvalho Moreira, que trabalha há três anos no Centro de Digitalização, afirma que adquiriu bastante experiência ali. “A interação é muito boa, se eu preciso de ajuda, posso contar com meus amigos. Trabalhar com processos também é muito legal, consegui aprender bastante coisa aqui”, comenta.
Daniela explica que essa interação gera maior confiança, e eles ficam mais preparados para enfrentar as situações cotidianas. Ela conta o caso de um funcionário que tinha vários problemas de saúde e hoje em dia tem uma qualidade de vida muito melhor. “Ele passou muito tempo sofrendo com um problema grave sem atendimento justamente pela falta de receptividade em relação à deficiência dele. Tudo isso diminui com o trabalho. Aqui eles são iguais e se sentem melhores. Quando entram aqui não querem sair de jeito nenhum”, garante Daniela.
Todos os funcionários do Centro de Digitalização recebem capacitação em libras, e hoje em dia não há nenhuma dificuldade para a comunicação direta. O estagiário William Kerscher conta que criou uma amizade muito próxima com os deficientes auditivos e a integração ocorre também fora do ambiente de trabalho. Um incidente narrado por Willian mostra as dificuldades que eles enfrentam no dia a dia. Certa vez em uma lanchonete nenhum funcionário quis atendê-lo (ele estava conversando em linguagem de sinais com um amigo). “Quem vai atender? Eu não sei falar com eles”, foi o que ouviu da conversa entre os garçons do estabelecimento.
A supervisora do Centro de Digitalização afirma que a sociedade precisa ter consciência de que os colaboradores com necessidades especiais têm capacitação para realizar qualquer trabalho e que é preciso quebrar a barreira da comunicação, como ocorreu no Centro.
Trabalho intelectivo
Para executar o trabalho, os deficientes auditivos precisam compreender as peças dos documentos, analisar o que deve ou não ser incluído no sistema. “Não é igual bater martelo como fazem nas outras empresas. Aqui eles têm que saber o que estão fazendo”, afirma Daniela. Ela ressalta que um dos diferenciais no TJ é o foco e a valorização da parte intelectiva das atividades.
Contratada há mais de um ano, Thais Mirelle Legiehn Rodrigues acredita que a experiência adquirida ali será muito útil no futuro. “Eu tenho vontade de ficar mais tempo aqui, e também quero fazer o concurso do Tribunal.”
Thaís elogiou a iniciativa do Tribunal de Justiça. Para ela os projetos têm que continuar se desenvolvendo. “Nós vemos que tem acessibilidade aqui. O projeto que envolve libras é muito legal porque também inclui intérprete, e ela fica o tempo inteiro junto com a gente. Conseguimos assim desenvolver bastante o lado profissional”, garante.
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