Durante o evento foi lançado um Informativo de Jurisprudência que divulgará decisões das Câmaras

Desembargador Bonejos Demchuk 


DESEMBARGADOR BONEJOS DEMCHUK 

Por Robson Marques Cury 

Bonejos Demchuk, filho de Serafim e Maria Demchuk, nasceu em Curitiba (PR), no dia 26 de setembro de 1936. Casou-se com Antônia Maria da Rocha Loures Demchuk. Formou-se bacharel pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR), na turma de 1961. 

Depois de exercer a advocacia, ingressou na magistratura como juiz substituto, após concurso em 12 de junho de 1964, atuando nas comarcas de Paranavaí, Maringá e Londrina. A partir de 22 de maio de 1967, já como juiz de Direito, Bonejos Demchuk atuou nas comarcas de Alto Paraná, Francisco Beltrão, Campo Mourão, Maringá e Curitiba. 

Em 25 de julho de 1990, Demchuk foi promovido ao cargo de juiz do Tribunal de Alçada. Em 22 de setembro de 2000, foi promovido ao cargo de desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR). 

Aposentou-se, compulsoriamente, em 26 de setembro de 2006. 

Faleceu em Curitiba, no dia 22 de agosto de 2020. 

Aprendi muito com o experiente magistrado Bonejus Demchuk, com quem tive o privilégio de trabalhar no Tribunal de Alçada ainda no exercício do cargo de juiz de Direito Substituto em 2º grau, privando da sua amizade. 

O mestre Bonejos tinha orgulho da cultura dos antepassados e a conhecia como poucos. Eu admirava a obra "Tarás Bulba", de Nikolai Gógol. A leitura das aventuras dos cavaleiros cossacos ucranianos exerciam fascínio sobre mim. Conversamos muito a respeito. 

Atendendo a meu pedido, o seu filho Marcos Vinícius, magistrado estudioso, sério e compenetrado, escolhido pelo Órgão Especial do TJPR para atuar no Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR), registra importantes fatos da vida familiar e profissional do seu papai. 

Bonejos nasceu em Curitiba em setembro de 1936 e cresceu no Bigorrilho; era filho de imigrantes ucranianos, Serafim Demczuk (Серафім Демчук) e Maria Hluszka Demczuk (Марія Глушка Демчук). Seu nome de família era Bohdan Demczuk (Богдан Демчук), tradicional nome eslavo que significa 'dádiva de Deus'. 

Quando nasceu, o pai, Serafim, em razão do trabalho, ficava muito tempo fora de casa, ia de colônia em colônia, seja de italianos, de ucranianos ou de poloneses, fazendo pequenas trocas comerciais. Com poucos meses de vida, Bonejos ficou muito doente.O pai não estava em casa, e, como não havia sido registrado e em decorrência da gravidade da situação, inclusive com risco de morte, vizinhos tiveram que ajudar a mãe Maria e foram registrá-lo, mas no assento civil ficou Bonejos Demchuk. 

Também em decorrência desta situação, foi alterada a data de nascimento. Tinha duas: uma oficial e outra correta, que foi adotada pela família. A mãe, Maria, nunca o chamava de Bonejos, mas sempre Bohdan.  

Até os 7 anos de idade, só falava a língua ucraniana. Começou a aprender o português quando foi estudar no Colégio Júlia Wanderley.  

Serafim parou de viajar e abriu uma mercearia no velho Bigorrilho. Como era comum naqueles tempos, a mercearia vendia de tudo, de gêneros de primeira necessidade, alimentos a granel, utensílios domésticos, e servia petiscos e bebidas. Ao final de cada dia, os moradores das redondezas, imigrantes ucranianos e de outras nacionalidades, reuniam-se na mercearia, pessoas humildes que muito contavam da Ucrânia e de outras partes da Europa. Toda a família, a mãe Maria e os filhos Bonejos e Ana, ajudava na mercearia. 

Torcedor do Coritiba, sempre contava sobre a primeira vez que tinha visto o time jogar. Tinha pouco mais de 10 anos e, junto com amigos, foi até o Clube Juventus, então localizado no que é hoje o Supermercado Angeloni, na Alameda Carlos de Carvalho, pularam o muro do clube e assistiram ao Coritiba ganhar do Juventus por 5x0. 

Dentre muitas histórias familiares, era famosa aquela que, com menos de 15 anos, sozinho, viajou de Curitiba até Palmas para visitar os avós maternos que tinham lá um sítio. O avô, André Hluszka, tinha sido ex-combatente da 1ª Guerra Mundial e, em 1929, trouxe a família da vila chamada Hodiv, perto da cidade de Ternópil, Ucrânia, para o Brasil. Parte dos filhos ficou em Curitiba, e ele, André, e sua esposa, Ksênia, compraram um sítio perto de Palmas. O avô, que até então não conhecia o neto, Bonejos, ficou surpreso com aquela criança que ali chegara, sozinha, de tão longe, e falando em ucraniano. Imerso na cultura ucraniana, quando jovem, tornou-se um exímio dançarino de folclore, muito frequentou a Sociedade Ucraniana. 

Estudou nas antigas dependências do Colégio Estadual do Paraná, então situado na rua Ébano Pereira. Com a construção das novas instalações pelo então governador Bento Munhoz, foi um dos seus primeiros alunos a frequentar o novo espaço. Aliás, quando falava do Colégio Estadual, tinha muito orgulho em dizer que tinha sido aluno de Bento Mossurunga, compositor do Hino do Paraná.  

Aprendeu equitação no curso de formação de Oficiais da Reserva, Artilharia Montada. Contava o quanto eram prazerosas as aulas de equitação que muitas vezes se davam nos campos que circundavam Curitiba no final dos anos 50. Todos da família ficavam surpresos porque, entre suas funções, devia ficar centenas de metros à frente das peças de artilharia, calcular a distância do alvo, o ângulo de tiro, comunicá-los aos atiradores e ver os projéteis passar por cima de sua cabeça para acertar o alvo mais adiante. Dizia ele, apesar da função e com o que concordávamos, não era muito bom em matemática. 

Neste mesmo período, Bonejos ingressou no curso de Direito da UFPR, momento em que teve a oportunidade de conviver com diversas personalidades paranaenses. Foi nesta época que conheceu, entre outros, colegas que viriam a ingressar na magistratura como Sidney Mora e Tadeu Costa. Ele também era assíduo frequentador da Casa do Estudante Universitário. 

Ainda na Faculdade de Direito, Bonejos foi convidado por um colega, cujo pai vendia gasolina, óleos e produtos comercializados por postos de gasolina, a percorrer o interior do estado para fazer cobranças. Assim, começou a conhecer melhor o Paraná. Quando formado, iniciou a advocacia na então cidade de Cruzeiro do Oeste, era o começo dos anos 60. Dizia ele: neste período a cidade era mais movimentada que Londrina e Maringá. Algumas vezes, percorreu o interior em pequenos aviões, sempre comentava sobre o ‘mar’ de floresta, muito diferente do que é hoje. 

Ao ingressar na magistratura, uma das primeiras comarcas em que o magistrado atuou foi Londrina. Lembrava que o salário que recebia como juiz substituto não pagava a pensão em que morava. Chegou a passar por algumas comarcas do Sudoeste e um dos ‘causos’ marcantes foi quando, em Barracão, recebeu uma visita inusitada: eram oficiais do exército argentino, acompanhados por oficiais do exército brasileiro. Os militares argentinos queriam explicar que apoiavam na Argentina determinado grupo político e, caso tivessem determinado ‘problema’ nos dias seguintes, perguntaram se poderiam pedir asilo no Brasil. Bonejos não entendeu muito bem o motivo e a ‘direção da conversa’, mas dias depois houve um golpe militar na Argentina e um dos oficiais, que conversou com ele, conseguiu um posto importante no governo. Inclusive tinha enviado um convite para a posse do novo governo. 

Bonejos conheceu a esposa, Antônia Maria, e se casaram em Maringá. Eles passaram a Lua de Mel em Balneário Camboriú, cidade que desde então faz parte da história da família. Tornaram-se muito amigos do desembargador Renato Pedroso e da esposa, dona Zula. Ele contava ainda que, de maneira involuntária, ajudou Hirosê Zeni a conhecer a esposa, Cibele, porque, a pedido deste, iriam fazer uma permuta de comarcas. 

Passou ainda pelas comarcas de Alto Paraná, Francisco Beltrão, Campo Mourão, Maringá e Curitiba. Foram muitas as histórias, os ‘causos’, compartilhados com Antônio Franco Ferreira da Costa, Zeferino Krukoski, Nério Spessato, Wilde Pugliese, Irlan Arco-Verde, Hermes Fonseca, Ruy, Luiz de Oliveira, entre outros. 

Bonejos não conhecia o exterior e com muita dificuldade foi convencido a viajar para a Ucrânia em 2016. Foram dias memoráveis naquela viagem, em que conheceu Lviv, Ternópil e Kyiv. Ele disse se sentir no velho Bigorrilho em Lviv, quando escutava o sotaque ucraniano local. Pôde visitar Szychowice, onde o pai Serafim nasceu, e Hodiv, vila da mãe, Maria. Antônia Maria, sua esposa, faleceu em 2017 e  Bonejos em 2020. Os dois deixaram os filhos Paulo, Marcos e Carlos, além  dos netos.  

A sua nora Rosana, da família Mikrut, entrevistada em 01 de agosto de 2018 pela Associação Paranaense do Ministério Público, conta: 

“Ter assistido a apresentação do Folclore Ucraniano Barvinok, atração do 57º Festival Folclórico de Etnias do Paraná (Folclorize), realizado no Teatro Guaíra, tem estreitos laços com o referido grupo, em razão da participação de sua família. O sogro de Rosana, Bonejos Demchuk, e a sua tia, Ana Demchuk, fizeram parte do grupo e, atualmente, seu filho Marcus Vinicius, de 07 anos, também participa. 

Ainda, familiares maternos também participam de outro grupo folclórico ucraniano, o Poltava. 

O espetáculo no teatro Guaíra foi magnífico. “A apresentação do Barvinok foi magnífica, com o teatro Guaíra lotado. O programa, muito bem traçado, levou para o público uma viagem para a Ucrânia, passando por suas estepes centrais, os Montes Cárpatos, as comemorações da chegada da primavera e os festejos dos famosos cossacos. Toda essa história foi muito bem interpretada pelos seus dançarinos, que tiveram o suporte necessário de sua própria orquestra e coral”, relatou. 

E explicou sobre a origem dos grupos ucranianos na capital paranaense:  

Em Curitiba, existem dois grupos de folclore ucraniano, o Barvinok, pertencente à Sociedade Ucraniana do Brasil e ao Poltava. 

O Barvinok foi fundado em 1930, por jovens agricultores e imigrantes ucranianos. É o grupo mais antigo do Brasil. Vindo, ininterruptamente, cumprindo a tarefa de disseminar e manter viva a cultura ucraniana através da música e da dança em diversas apresentações nos territórios nacional e internacional. 

Os dois grupos (Barvinok e Poltava) são do mesmo nível, possuindo um extraordinário coral, excelentes dançarinos e coreógrafos. Nesse ano, o grupo folclórico Barvinok e o grupo Poltava repetiram o sucesso dos anos anteriores, lotando o Teatro Guaíra durante o festival folclórico. 

Em reconhecimento à importância do trabalho realizado pelo Grupo Barvinok, em 2010, o Governo Democrático da Ucrânia concedeu ao grupo o título de "NARÓDNYI AMATÓRSKYI UKRAÍNSKY FOLKLHÓRNYI KOLEKTEV BARVINOK", título atribuído aos mais importantes grupos que contribuem para a manutenção da cultura do país.  

Ainda, a associada conta que Marcos Vinícius, seu filho, frequenta todos os sábados a Sociedade Ucraniana do Brasil, onde é aluno da "Escola do sábado Lessia Ukrainka" (Subotna Schkola Lessia Ukrainka)*: 

A participação do Marcos Vinícius é no grupo infantil da "Subotna Schkola". As crianças realizam seus ensaios todos os sábados à tarde na sociedade ucraniana, local em que funciona a “Subotna Schkola Lessia Ukrainka”. Trata-se de uma escola ucraniana na qual, além do folclore, também ensina a língua ucraniana e o artesanato, como por exemplo, a pintura de "pêssankas". A escola do sábado ensina a cultura ucraniana para crianças descendentes, ou não, de ucranianos. 

*Lessia Ukrainka era uma escritora ucraniana cujo pseudônimo “Ukrainka” significa em ucraniano livre Lessia Uuraniana. 

A tradição nas suas famílias, vem sendo transmitida de geração em geração, e o amor por essa cultura e seus costumes fortalece ainda mais a mensagem que é repassada para os familiares. “Os meus antepassados e os do meu marido vieram da Ucrânia. Cujos costumes foram sendo transmitidos de pais para filhos. Desde criança, fui ensinada a apreciar a cultura ucraniana com toda a sua riqueza. E o amor por esta cultura, consubstanciado na dança, nas artes e no aprendizado da língua ucraniana, faz com que queiramos manter viva essa tradição”. 

Descrição da imagem de capa: Arte gráfica com estantes de livros no fundo e no centro o título com os dizeres - História do Judiciário Paranaense.