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História do Judiciário: Magistrado José de Andrade Faria Neto

Legenda

HISTÓRIA DO JUDICIÁRIO: MAGISTRADO JOSÉ DE ANDRADE FARIA NETO

Por Desembargador Robson Marques Cury

Curitibano, nascido em 23/11/1946. Bacharel em Direito. Oficial da Polícia Militar. Delegado de Polícia. Como magistrado iniciou e terminou a carreira no interior do estado. Aprovado em concurso público, foi nomeado em 1978 Juiz Adjunto da Seção Judiciária da comarca de Ivaiporã. Após périplo por diversas comarcas, aposentou-se em 1990 como juiz de direito da 5ª. vara criminal de Londrina. Posteriormente exerceu a advocacia. Administrador desde 2008 da Fundação Honorina Valente, instituição filantrópica criada em 1981, destinada a coordenar programas sociais voltados a crianças e adolescentes carentes e idosos. Participa desde a fundação, no ano de 2001, do Conselho de Administração da Cooperativa dos Juízes e Promotores (Credjuris), filiada ao sistema Sicredi, em trabalho voluntário.

O conheci em 1982, quando eu ocupava o cargo de juiz de direito em Toledo, e ele judiciava na comarca de Assis Chateaubriand. O Doutor Faria me foi elogiado em razão do seu trabalho desenvolvido nessa comarca pelo então bispo de Toledo, Dom Geraldo Majella Agnelo, depois Cardeal Primaz do Brasil em São Salvador da Bahia.

Nossa amizade estreitou-se quando fundamos a Credjuris sob a batuta do magistrado Paulo Habith. Tendo por afinidade o gosto pelas motocicletas, fotografia e viagens, participamos de muitos passeios.

Sua esposa Eleonora, recordou a saga da vida do juiz e de sua família no interior, quase meio século atrás, em expressivo e detalhado depoimento, a despeito das difíceis passagens administrativas e políticas.

 

Nossa família tomou novo rumo em 1978, casados há sete anos, com três filhos pequenos Andréa, Ricardo e Cristiane nos vimos distantes dos familiares e amigos, quando José passou no concurso de juiz adjunto, sendo nomeado para Ivaiporã, em 18 de janeiro. De raízes italianas, muito apegados à família, nunca cogitamos viver longe dos nossos laços e sair da tão desenvolvida capital, era até amedrontador.

Com formação em Direito, José era delegado de Polícia e, atraídos por melhores condições de vida e conforto, decidiu dedicar-se aos estudos para passar no concurso de juiz de direito. Naquela época, primeiro era preciso ingressar na carreira sendo aprovado no concurso de juiz adjunto e, só então, ter aprovação em novo concurso para ser efetivado como juiz de direito.

Com a nomeação de José para Ivaiporã como juiz adjunto decidimos para garantir deixar o nosso apartamento montado em Curitiba caso José não passasse no concurso para ser efetivado.

Estávamos realmente ansiosos e até um tanto assustados com o novo horizonte que despontava.

E lá fomos nós bem cedinho viajando de mudança em uma Brasília bege eu, José, nossas crianças, meus pais e uma ajudante. Carro carregado, e até hoje não entendo porque levamos no bagageiro do carro um aquecedor Prosdócimo, modelo Flandria, talvez por receio de passar frio, mania de curitibano.

Houve um contratempo com a chegada da nossa mudança. Como queríamos nos anteceder para receber a mudança em Ivaiporã chegamos um dia antes mas não contávamos com um imprevisto, pois o caminhão da mudança estragou durante a viagem e tivemos que aguardar três dias.

Não tínhamos como nos acomodar, o recurso foi ir para o único hotel da cidade, infestado de baratas. Apavorante! Ai, que vontade de dar meia volta!

Um calor de rachar carrapato, suávamos às bicas, as crianças já sem mudas de fraldas (na época não existiam as práticas fraldas descartáveis), nem imaginávamos que as roupas ficariam manchadas com a típica terra vermelha daquela região do Paraná. Eu levei pouca roupa achando que a mudança logo viria, só tinha uma calça comprida clara, me senti muito mal com a impressão das mãozinhas das crianças em minha roupa toda suja de terra vermelha. Levamos alguns dias para nos organizar melhor. Acredito ter ficado traumatizada, porque hoje ao viajar exagero na bagagem.

A fim de conhecer a região, resolvemos visitar as cidades próximas. Ao passar em uma cidade vimos na rua um homem puxando um cavalo para dentro de um bar. O cavalo empacava e puxava o homem para fora, não querendo entrar. Nessa hora minha mãe disse: " Vejam! O cavalo tem mais juízo que o cavaleiro." Nesse momento respondi: " Mas nunca vou morar num lugar desse! " e o José retrucou: " Pois vai se preparando, que é dessa cidade pra pior ".

Ironia do destino, ou providência divina!?

Foi para lá que seguimos, agora concurso efetivado, José primeiro juiz de direito, da comarca de São João do Ivaí, nomeado em 09 de agosto de 1978.

Levávamos de Curitiba à São João do Ivaí umas cinco horas de viagem em estrada com uma só pista e sem asfalto. Como não havia GPS para nos localizar íamos perguntando às pessoas que encontrávamos no caminho.

Foi em uma das perguntas que nos responderam: Vira lá, "napracaluá" seguimos enfrente sem entender muito, mas chegamos. Graças a Deus!

Numa de nossas tantas idas e vindas, avistamos no mato uma placa de madeira com letra manuscrita a palavra LUAR, era o nome do lugarejo onde devíamos fazer a curva para entrar na estrada para nossa nova cidade.

Quando visitamos nossa futura casa em São João do Ivaí não me agradou o colorido forte dos cômodos pintados um de cada cor e os rodapés de cores contrastantes. Pedi que deixassem toda a casa, que era de madeira, na cor amarelo creme com as portas e os rodapés na cor marrom. Acharam um tanto monótono meu pedido. Porém, devo ter lançado moda, logo apareceram outras casas com a mesma pintura.

A necessidade de mais orientação às práticas forenses, de início tornou a profissão um tanto árdua para o José, pois, em vez de receber alguma ajuda ou conselho que precisava, escutava daqueles que poderiam ajudá-lo " Vista a toga, doutor " ou " Leia o código ", deixando-o mais nervoso e inseguro.

Se houve gente contra, tivemos muitos anjos a nosso favor, aos quais seremos sempre muito gratos.

José sempre foi muito responsável, correto, justo e idôneo, motivos pelos quais muito nos orgulha, não só como profissional, mas também como pessoa. Nunca faltou estudo, perseverança, fé e empenho em fazer justiça e ajudar quem precisasse de sua orientação.

As pilhas de processos iam diminuindo. E, nossa vida começava a seguir mais tranquila com novas amizades e alguns compadres.

As crianças crescendo saudáveis vez ou outra se fazia necessário a " operação pente fino " para evitar ou até eliminar os famosos piolhos.

Nossa casa ficava num final de rua com um horizonte muito verde. Avistava-se uma enorme plantação de café, que pertencia a uma fazenda, de onde comprávamos quatro litros de leite toda manhã, eram colocados num galão de alumínio, na soleira da nossa porta. O leite era fervido e após esfriar formava uma grossa camada de nata, com a qual fazíamos deliciosas bolachinhas.

A Rodoviária era ao lado da nossa casa. Não foram poucas às vezes que o motorista do ônibus trazia de Curitiba um pacote e, passando-o por cima do muro, dizia sempre em alta voz: "Dona, o bolo chegou dona!” Eram dias de grande festa com os quitutes deliciosos da "nonna" saudosa. Ah! Que doce saudade...

E, quando chegavam os parentes então tinha lugar para todos, às vezes mais de quinze pessoas. A fim de acomodá-los, numa ocasião, colocamos nossa caçula para dormir em nossa cama, cedendo o berço a um priminho. Lá pelas tantas da madrugada, José pede que eu a atendesse, pois imaginou que ela teria feito xixi na cama. Verifiquei, mas que nada! De repente, foi um tal de levantar os colchonetes espalhados pela casa e minha cunhada pedindo balde pois estava chovendo no berço. Foi um reboliço só, ninguém mais dormiu com as goteiras na cama e por todos os cantos da casa. Era um tal de arrastar móveis para desviar os pingos.

Era muito bom e animado quando a casa estava cheia, dava uma tristeza quando iam embora. Mas, mesmo assim a vida seguia bem mais leve, e a capital cada vez mais distante. E para matar as saudades foi combinado com a família que faríamos ligações telefônicas toda a semana. Tarefa nada fácil, pois tínhamos que ir até a telefônica, pedir à telefonista que tentasse uma linha e aguardávamos até completar a chamada. Quando conseguíamos a exigência dos avós saudosos era conversar com todos e saber das novidades, conversavam inclusive com a caçula que mal balbuciava um " angu ". As ligações ficavam caras, pois as conversas eram longas e ainda sem nenhuma privacidade, visto que todas as pessoas que esperavam para fazer as suas ligações escutavam as nossas novidades.

A comunicação foi resolvida com o envio de cartas e lindos desenhos coloridos aprimorados com o tempo, guardados ainda hoje. Benditos sejam os celulares e os meios modernos de comunicação.

A pior comunicação era com as ajudantes. Houve uma que me causou estranheza, pois eu falava, explicava o que eu precisava ou queria que ela fizesse, e ela me respondia “ Sim, senhora! ”. E, nada. De início pensei que houvesse algum problema auditivo, mas fiquei sabendo que ela perguntou a outra pessoa se eu falava em inglês. Foi aí que percebi que eu tinha que falar mais pausadamente para ela entender o que eu dizia. Se para essas pessoas era difícil me entender a recíproca era verdadeira, visto que tive que aprender o significado de muitas palavras como: acoxá, balangá, cascá e entre elas "naplacaluá". Foi uma troca de saberes com ótimo aprendizado, como foi!
Os filhos já em idade escolar, todos os dias levávamos e buscávamos na escola, junto com outros coleguinhas, numa cidade próxima, São Pedro do Ivaí.

Nos fins de semana e durante a semana após o expediente do fórum, lá estávamos nós na Associação Banco do Brasil (AABB). Nos divertíamos muito e nos refrescávamos na piscina. O calor era intenso. Deixávamos o carro estacionado na sombra, de baixo das árvores, e na hora de irmos embora, as galinhas já haviam se recolhido nos galhos das árvores, o carro estava com uma nova pintura.

As noites eram lindas, agradáveis e muito quentes, o céu estrelado sempre propiciava "tomar uma fresca". Foi quando vi um bichano no telhado de olhos brilhantes. Que bonitinho o gatinho, falei. José observou melhor, dizendo: “Gato nada, é um quati”. Nos recolhemos sem muita fresca naquela noite.

Costumávamos deixar sempre as janelas abertas para refrescar. As crianças se acomodavam cedo, era o ritual diário banho, janta e cama. Com o silêncio da noite eu aproveitava para organizar a cozinha e os afazeres do dia seguinte, José trabalhava nos processos numa salinha próxima da sala de estar, junto à varanda. De repente, ouço meu nome num grito que me assustou, era José apavorado pedindo socorro para capturar uma perereca que havia pulado janela adentro. Nos armamos de vassouras e panos, nos trancamos na sala para que a "fera" não fosse para outros cômodos. Deixamos só a porta da varanda aberta para que ela pudesse ir para fora da casa. Nossa vizinha, que era professora e dava aulas à noite, nessa hora passou por nós e, vendo a cena daquela "caçada", nem nos olhou para o habitual "boa noite"! No dia seguinte, falando com ela sobre o ocorrido, me disse: "Nossa, pensei que vocês estivessem brigando". Tal foi a cena com vassouras, rodo, panos nas mãos e falando alto, que ela não poderia ter imaginado diferente.

Era sempre assim, quando já estávamos adaptados, tínhamos que mudar de cidade. Começava tudo de novo, novas expectativas, novas pessoas, casa, escola, amigos e novas pilhas de processos. As crianças esperavam que na nova casa tivesse quintal para brincar, poder andar de bicicleta, árvore para subir.

Assim sendo, houve mangueira, goiabeira, figueira, romã, fruta do conde, o polêmico cajueiro, o barulhento abacateiro e a cheirosa e famosa jaqueira. Tivemos uma pequena horta, colhíamos salsinha, cebolinha, couve, tomate, pimentão, espinafre e a mandioca que era tirada da terra vermelha, ¨cascada¨ no dia em que era cozida, macia e muito saborosa.

A vida seguia mais leve, mas sempre séria como a responsabilidade exigia, José sempre "vestiu a toga" com respeito e dignidade, como é de seu feitio ser respeitoso e correto em tudo que faz.

Na cidade de Mandaguaçu, passamos por duas fases: Antes da Itália (AI) e Pós Itália (PI). Na fase AI houve uma boa adaptação, pois a cidade tinha uma boa infraestrutura e o nível cultural era maior.

A casa de Mandaguaçu era menor em relação as outras casas em que moramos. Ficava ao lado da casa do promotor, separadas por uma cerca de arame que estava mais pra lá, do que pra cá, decidiu-se que a solução seria fazer um muro, mas havia um cajueiro. O tronco da árvore estava no terreno da casa do promotor e se desenvolveu de tal forma que seus galhos e frutos pendiam no terreno da casa do juiz. Essa situação pediu um acordo entre os moradores das duas casas para que ninguém ficasse favorecido em relação aos frutos, estabeleceu-se que o cajueiro pertencia aos dois terrenos e todos teriam direito de aproveitar os seus deliciosos frutos. E assim o muro ficou entre as casas até onde estava o tronco da árvore, interrompido, e continuando logo após o cajueiro, seguindo no comprimento do terreno. Sem parcialidade, justiça feita! Brindada com suco de caju!

Na casa do vizinho que fazia fundos com a nossa, existia um enorme abacateiro com frutos gostosos. Era com frequência que nos assustávamos com o barulho da queda de um abacate no telhado de nossa casa, quando também não era uma telha quebrada. Como senão bastasse o barulho dos abacates, certa ocasião começamos a escutar um ruído no forro da casa e também sentir um mau cheiro. Descobrimos que tínhamos hóspedes, uma família de gambá, prontamente resolvemos despejá-los com a ajuda de dois funcionários da prefeitura que subindo no forro da casa os colocaram num saco de estopa e os soltaram, em um mato distante.

Tínhamos, também outras distrações como os revezamentos dos almoços com os compadres, amigos em cidades vizinhas. Um joguinho de baralho com vizinho, passeios e visitas como ocorreu certa vez quando nosso compadre e cunhado responsável em levar artistas para cantar nas praças e coretos da região trouxe a cantora Ademilde Fonseca a participar juntamente com o conjunto de "chorinho" de Janguito do Rosário. Passaram por Mandaguaçu e tivemos a satisfação de recebê-los mesmo que rapidamente para duas paradinhas. Na segunda parada na volta do show, a cantora revelou que tinha ficado acanhada em pedir para comer  banana, as quais havia visto na fruteira. Como se sentiu mais a vontade naquele momento não reprimiu o seu desejo.

As cidades da região tinham na sua grande maioria as ruas e estradas de chão batido, era raro quando havia asfalto. Quando chovia era necessário colocar correntes nas rodas dos carros para que não derrapassem, nem atolassem.

Certa vez, José foi fazer uma palestra e a chuva intensa nos pegou de surpresa, estávamos sem corrente no carro. Por sorte foi no retorno para casa que o carro atolou. E não houve outra maneira a não ser eu na direção e José arregaçar as calças e empurrar o carro na chuva e no barro. Só foi possível sairmos do atoleiro com o aparecimento de um trator que rebocou o carro e o palestrante enlameado.

Retornando das férias de janeiro de 1982 José recebeu um convite da Faculdade Católica de Milão para fazer o curso de direito civil. E, também, posteriormente de direito penal.

Depois de muito pensar e ponderar decidimos nos organizar para essa nova empreitada que precisaria ser feita com toda a família.

Deixamos a casa em Mandaguaçu montada e fechada, fomos para Curitiba fazer os preparativos para a viagem.

Todos os familiares e amigos foram se despedir no aeroporto, houve muita emoção. Estivemos um ano longe, mas muito próximos no coração.

Passamos o ano de 1983 na Itália, José foi um dos primeiros juízes de direito do Paraná a ir estudar fora do país. Fomos por conta própria, com somente o salário que recebíamos em cruzeiros, fazendo o câmbio em dólares e depois em liras, o que nos ensinou muito a valorizar cada centavo “avevamo bisogno di risparmiare, e molto”. Ano de muita experiência cultural e pessoal, para toda a família.

Foi um contraste grande sair de uma cidade do interior do Paraná para morar numa metrópole europeia, Milão. Após um ano, voltamos para Mandaguaçu, também sentimos quão contrastante foi nosso retorno.

O Fórum, que antes era num prédio no centro da cidade na rua da prefeitura, agora tinha sido transferido para uma nova construção em modelo padronizado para as novas comarcas de entrância inicial daquela época. Sua localização agora facilitava a ida de José ao trabalho pois nossa casa ficava bem mais próxima.
Surgiram novas casas e lojas. Muita coisa havia mudado. Inclusive nós. Chegamos mais confiantes nos sentindo bastante queridos por saber que sentiram a nossa falta. E, pelas remessas de cartas e cartões que recebíamos quando estávamos na Itália.

A nossa vida social ficou mais intensa, com mais frequência nos encontrávamos com compadres e amigos, nas cidades pela região de Maringá, onde fazíamos nossos passeios.

Na época do carnaval houve no clube da cidade um concurso de fantasia, as crianças fizeram parte de um grupo carnavalesco onde ganharam primeiro lugar, com direito a um troféu pela melhor fantasia: " Os Ciganinhos ".

Nos finais de semana íamos com as crianças na praça da Igreja, lá elas dirigiam um “ buggy ” e ficavam às voltas, se revezando, dando carona aos amiguinhos que faziam fila.
Já tínhamos muita experiência em mudanças, eram quase nove anos de interior e um ano de Itália quando fomos para próximo de Foz do Iguaçu. Fomos para a cidade de Assis Chateaubriand mesmo assim ainda sentíamos aquela expectativa de ir para um novo lugar e um certo sentimento saudoso em deixar os amigos e as rotinas conhecidas.
Nossas crianças tinham agora uma compreensão bem maior da vida como se comunicar em outros idiomas; noções de economia, pois ouviam falar em dólar, câmbio; tinham uma boa percepção de que o mundo era bem mais vasto do que só estar em casa com a família. Recebiam um dinheirinho para nossas frequentes viagens ao Paraguai, atravessávamos a Ponte da Amizade e lá estávamos na Ciudad del Este. O paraíso das compras, que de tanto irmos, se tornou muito banal. Gastavam nos centros comerciais, nas lojas e fugíamos do assédio dos camelôs. Por pouco não viramos sacoleiros!

Mas os passeios com as crianças não ficavam só nas compras de lápis, canetas e borrachinhas para as famosas coleções, muitos ouviram sobre história e geografia completando as aulas dadas nas Escolas Públicas onde sempre estudaram. E claro, não faltaram poses para fotos no Marco das Três Fronteiras - Brasil, Paraguai e Argentina, e nem na imensa Represa de Itaipu, onde realizamos um belo passeio por dentro da Usina, na época recém construída.

Um dos nossos passatempos nos finais de semana chuvosos era jogar Banco Imobiliário, ficávamos de sexta até domingo com o tabuleiro montado para terminar o jogo e saber quem era o maior investidor.

Mas na maioria das vezes o calor permitia passeios de bicicleta, brincadeiras no quintal, mexer na terra, subir em árvores, como na famosa jaqueira na frente da varanda, na qual nosso filho ficava pendurado de cabeça para baixo, feito um macaquinho, pulando de galho em galho.

Meu sonho sempre foi montar um jardim de infância, sonho este que realizei criando meus filhos sob o meu olhar maternal e atento, com a casa sempre cheia de amiguinhos. Tanto que minha ajudante comentava que na minha casa parecia aniversário todo dia. Sempre me senti muito útil e abençoada por poder estar em casa e propiciar tranquilidade ao meu marido, por saber que eu estava orientando nossos filhos em suas brincadeiras, estudos e aprendizados.

Foi em Assis que nossos filhos aprenderam datilografia, um aprendizado muito útil, que os tornou bastante rápidos e hábeis, facilitando posteriormente a digitação.
Na intenção de que nossa filha adquirisse mais experiência para sua vida, sem pensar em salário, conseguimos um trabalho para ela auxiliar no cartório da cidade. Ela contou que no cartório havia uma máquina de escrever elétrica e ninguém usava, pois não sabiam como lidar. Para nosso orgulho nossa filha foi muito elogiada pelo seu trabalho significativo, além de ensinar os demais colaboradores a utilizar a máquina de escrever.

José, nosso filho e eventualmente os sobrinhos frequentavam a barbearia do Martielo, que curiosamente era pessoa notória em Assis Chateaubriand, na época recordista brasileiro do maior bigode, alcançando mais de metro de comprimento.

Passados três anos, nossos filhos já entrando em idade de preparação para o vestibular, uma vez que as escolas públicas estavam em greve e José sendo removido para Cianorte atuando na Vara Criminal e de menores, decidimos que seria melhor nossas crianças e eu voltarmos para Curitiba.

José, em Cianorte, continuou sua carreira com idas e vindas nos finais de semana para matar um pouco a saudade da família, sendo depois promovido como Juiz da Final na Quinta Vara Criminal da Comarca de Londrina e como nossa intenção sempre foi retornar à nossa querida cidade natal, José se aposentou.

Se de início nossa vida no interior não foi fácil, valeu a experiência. E hoje podemos lembrar, com certa nostalgia, esse tempo que nos fez crescer como família, fazendo amigos, com memórias valiosas e momentos marcantes.

 

 

E, assim, finaliza Eleonora, rememorando com rara felicidade as vicissitudes do ponto de vista da esposa e dos filhos que acompanham e participam da carreira do magistrado.

 

Por Desembargador Robson Marques Cury